
O coração é um órgão corporal presente
em muitos animais, inclusive no homem. Mas há também outros sentidos de se
falar em coração. Há o sentido de centro espiritual da afetividade humana e
também aquele do íntimo do homem, como que o mais profundo de seu ser. Queremos
falar hoje deste último caso e de certos tipos de coração que conseguimos
encontrar: dois que já conhecemos, o de pedra e o de carne, mas também um outro,
que parece estar entre os dois: o de metal. O nosso objetivo deve ser sempre
ter um coração de carne, como o de Cristo e como aquele que Deus prometeu a
Israel no lugar dos seus corações de pedra. Mas este objetivo é árduo e só pode
ser alcançado com o auxílio da graça e, na sua busca, devemos lutar para não
desenvolvermos corações de pedra ou, como o que falei, de metal.
Analisemos, primeiro, a temperatura
dos corações. Aquilo que é quente não está preocupado em absorver calor, mas em
doá-lo àquilo que está próximo. Assim é o Coração de Jesus: Fornalha Ardente de
caridade, como rezamos na ladainha. Ele, a despeito de todo o desprezo que
recebe daqueles que está ao seu redor, procura sempre partilhar o que tem com
eles, que é a Sua própria vida divina. Conosco é assim, também. Apesar de todos
os nossos pecados, de nossa frieza, Nosso Senhor quer sempre dar o Seu calor
para nós, partilhar conosco Sua vida. Na física, quanto maior a diferença de
temperatura entre dois corpos, maior o fluxo de calor entre eles; e na nossa
relação com Deus, quanto mais distantes estamos Dele, quanto mais frio está o
nosso coração, mais Jesus quer dar a nós o Seu amor, quer nos fazer participar
do amor que Ele tem por Deus Pai. Esta é a caridade, simbolizada pelo calor do
coração: o desejo de em tudo agradar a Deus, de tudo referir a Ele. E é esta
caridade que o Coração de Cristo quer comunicar àqueles que se aproximam Dele.
E quanto aos movimentos do coração?
O coração bate para dar a vida ao corpo inteiro, trabalhando incessantemente
para que não falte sangue a nenhum órgão e que este não venha a desfalecer. O
Coração de Cristo é a fonte de vida do Seu Corpo Místico: a Santa Igreja. Ele
trabalha incessantemente para levar a graça divina a cada membro do Seu corpo,
para que nenhum se separe de Deus, para que nenhum perca aquele calor, aquela
caridade de que falamos acima. Jesus não se conforma em apenas desejar aquecer
o que está frio, mas Ele trabalha incessantemente para manter aquecidos
aqueles que estão em comunhão com Ele.
O Coração de Jesus não é duro como
uma pedra, que se quebra em mil pedaços se for golpeada, deixando apenas poeira
para trás. Não: Ele é um coração de carne, do qual, quando golpeado, jorraram
sangue e água. É o Coração sensível que encheu-se de compaixão pela morte de
Seu amigo Lázaro e pelas misérias de tantas pessoas que encontrou no seu
caminho e que continua a encher-se de compaixão pelas nossas misérias. Cada dor
Sua teve como resposta rios de misericórdia; cada “pancada” que as misérias alheias
lhe davam, devolvia com atos de amor.
Falamos, até agora, do Coração amabilíssimo
de Nosso Senhor, o qual devemos buscar imitar. Mas e quanto aos outros dois
tipos? Com um nós já temos certa familiaridade: o coração de pedra. Este é
duro, frio e imóvel. Não se preocupa com nada nem com ninguém além de si
próprio, não buscando compartilhar nada do que é seu, não movendo um dedo para
a edificação daqueles que estão ao seu redor e muito menos se compadecendo das
misérias alheias. Deste nós sabemos que devemos fugir a todo custo. Mas o que
seria o coração de metal?
Vejamos como são as máquinas de
metal. Elas são frias, embora possam superaquecer em alguns momentos, duras e,
diferentemente das pedras, tem um movimento que simula o de algo vivo. Assim
são os nossos corações muitas vezes: frios, não querendo partilhar nada com
ninguém, apenas receber o que lhes apraz; duros, indiferentes às misérias
alheias; e aqui está o que pode nos iludir: movem-se com certa artificialidade
semelhante à dos corações de carne. Infelizmente, talvez seja este o estado da
maioria dos corações dos cristãos em estado de graça. Não estão completamente
mortos, pois para uma máquina se mover é preciso energia, que podemos dizer que
seja a graça divina, mas os seus movimentos não são os de homens caridosos que
querem em tudo fazer a vontade de Deus. Muitos estão ainda encharcados de amor
próprio e o cumprimento da lei para eles não passa de um movimento exterior e
artificial, visando sempre fazer o mínimo necessário para a própria salvação e
depois dispersar-se no próprio egoísmo. É a triste tibieza. É comum passarem
pela inquietação dos escrúpulos, pois, buscando apenas o mínimo necessário, se
sentem sempre por um fio de não o terem feito; inquietam-se com o menor “defeito
em seus circuitos” ou com o menor amassado na sua carapaça de metal, que
geralmente é muito difícil de se consertar por completo, devido a dureza do
material, porque estão ainda muito apegados a si mesmos e não tomaram a decidida
decisão de entregar a vida a Cristo.
Como é triste e frustrante a nossa
vida quando estamos neste estado... E ao contrário, como é feliz viver só para
Deus! Não nos frustramos mais com nossas misérias: a humildade que Cristo
partilha conosco nos faz vê-las em paz e pouco olhar para elas, mas mais para
Aquele que pode curá-las. Nossos trabalhos e orações não nos são pesados,
embora possam ser sofridos, porque a caridade de Cristo que nos impele faz com
que queiramos aquilo que Ele quer.
Enfim, torna-se feliz a nossa vida quando visamos somente a
Deus. Quando o fazemos, nosso coração se aquece de tal modo que vê Deus em tudo
e sua contemplação o faz feliz e desejoso de partilhar com os homens o calor que
recebeu de Deus e, por isso, logo se põe a bater forte, trabalhando com ardor no
serviço a Jesus e aos seus semelhantes. Também nosso coração se torna capaz de
compadecer-se das misérias alheias e quer fazer tanto quanto o possível para
consolá-las; inclusive, busca consolar o Sagrado Coração que tanto sofre com as
ofensas humanas.
E isto, meus amigos, não é coisa de sentimentos. É, sim,
coisa de uma razão iluminada pela graça, que consegue saber o que é bom e agrada
a Deus e de uma vontade fortalecida por ela, que se esforça para fazer o que a
razão a indica, mesmo que seja doloroso ou que seus sentimentos apontem na
direção contrária. Isto é amor. Isto é ter um coração cristão autêntico: buscar
agradar a Deus em tudo, esforçando-se constantemente para ser mais amigo de
Cristo através do cumprimento da vontade de Deus, que é amá-Lo sobre todas as
coisas e ao próximo como a nós mesmos.
Não nos inquietemos se ainda não possuirmos este coração de
carne... Nem olhemos em demasia para nosso coração duro. Fixemos, antes, o
nosso olhar em Cristo, o Médico Divino, para que Ele trabalhe e conserte as
nossas misérias. Olhemos incessantemente para a Santa Beleza que é Deus, para
que ela imprima Sua marca em nós, transformando o nosso coração em um coração
semelhante ao Seu.
Que Deus converta o meu e o seu coração! Recorramos a Nossa
Senhora, aquela que tem o Coração mais semelhante ao de Cristo de todas as
criaturas, para que ela clame a Deus por nós, a fim de que Ele transforme os
nossos corações.
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