E se eu dissesse que todo homem tem vocação de filósofo? Em um primeiro momento, com certeza isto soaria estranho. Mas vejamos bem se não é verdade. Filósofo significa amigo da sabedoria, etimologicamente e sabemos pela fé que todos os homens são chamados a serem cristãos batizados e viverem como tais o que, em outras palavras, significa serem chamados a serem amigos de Cristo. Ora, não é Cristo a Sabedoria encarnada? Logo, todos os homens são chamados a serem filósofos.
A vocação última do homem é intelectual. Toda criatura se realiza plenamente quando exerce perfeitamente o seu fim, quando faz perfeitamente aquilo que está de acordo com sua natureza. O homem, sendo um animal racional, deve que ter como vocação última algo que envolva seu intelecto e, de fato, tem: todo homem é chamado a ser filho de Deus não só na Terra pela graça, mas, principalmente, no Céu pela glória de Deus, pela qual ele contemplará e conhecerá Aquele que é tal como é. No Céu, o homem contempla a própria essência de Deus, não só os pequenos reflexos que encontramos nas criaturas e que já nos maravilham tanto. Tudo aquilo de bom que encontramos sobre a face da Terra é reflexo Daquele que é o Sumo Bem. Qual não será então a felicidade dos bem-aventurados, daqueles que já estão gozando desta contemplação? Isto nos deve encher de esperança e nos fazer encarar a morte não como algo terrível, mas como uma bela passagem para a vida eterna. Deve, também, nos lembrar de nos prepararmos constantemente para ela enquanto vivemos, através da oração, das boas obras, da fuga do pecado, da recepção dos sacramentos. A morte deve ser para os cristãos como que a linha de chegada de uma longa maratona corrida com muita felicidade, onde nós encontraremos o troféu que recompensará todo o nosso esforço. Infelizmente, para aqueles que não buscam seguir a Cristo, para aqueles que vivem para o pecado, a morte acaba sendo como um abismo para o qual são arrastados ao longo da vida, não importa o quanto eles tentam fugir, se segurar, resistir; o abismo sempre acaba vencendo e eles são caem nele por toda a eternidade, se não procurarem a reconciliação com Deus.
Engana-se quem pensa que a filosofia é simplesmente uma série de abstrações e ideias que não servem para nada a não ser para ocupar o tempo e gerar um pouco de prazer intelectual. Não! A filosofia, a amizade com a sabedoria, é um agente transformador de nossas vidas. Que pobre o conceito de uma filosofia que só se preocupa com aquelas questões distantes e abstratas... A filosofia verdadeira nos diz qual é a vida boa e nos prepara para a morte! Vejam Sócrates perto da morte no Fédon de Platão. É um homem felicíssimo! Não teme de modo algum o destino que o espera. E Nosso Senhor, o maior filósofo de todos os tempos, como alguns dizem: foi atacado pelos temores próprios de um homem, que de fato é, mas se entregou por todos nós. Não fugiu da morte, mas a encarou e a venceu, ressuscitando. Vejam também os santos, sejam doutos ou não: na hora da morte estavam tranquilos. Alguns mártires chegaram até a rir de seus algozes enquanto queimavam. Digo que todos eles foram filósofos no sentido em que estamos falando.
Está bem claro que a vida filosófica, a vida cristã nos faz encarar a morte com muita tranquilidade, pois nos reserva um prêmio por nossos esforços e sofrimentos suportados na Terra. Mas e quanto a maneira de encararmos a vida? Quando falamos da morte com esperança de algo melhor que esta vida e como recompensa pelo que fizemos nela, às vezes podemos causar a impressão de que esta vida deve ser triste e amarga para que a próxima seja alegre e doce. Terrível engano! Isto é o que afasta muitos do caminho da salvação, infelizmente: acham que a vida cristã é uma vida triste... Nossa vida deve ser muito sofrida, é verdade, pois temos que tomar nossa cruz e seguir. Mas, nesta vida nosso fardo não é pesado e nosso jugo não é duro, porque são os de Cristo, que tem o fardo leve e o jugo suave. O filósofo que se prepara todos os dias para morrer é, na verdade, aquele que melhor goza da vida. A vida que temos aqui deve ser um antegozo do Céu. Aqui, como batizados, já possuímos a Deus em nossos corações e já podemos, de certa forma, contemplá-Lo em nosso interior, sem falar na Eucaristia, pela qual nos unimos de maneira ainda mais íntima ao Verbo divino. E na Terra, quando agimos "com verdade", como falava São João Paulo II, somos felizes. Este agir com verdade é agir conforme a Verdade, configurando-se a Cristo através de nosso abraço aos valores éticos objetivos que estão na mente de Deus desde toda a eternidade.
Por isso, não precisa se preocupar em de fato estudar filosofia aquele que tem outro plano para a própria vida, embora isto fosse algo bom de se fazer, se puder. Quem não puder ou não quiser ser filósofo no sentido mais estrito pode ser filósofo neste sentido mais amplo do qual estamos falando neste texto (que é muito melhor que ser filósofo apenas de profissão ou que qualquer doutorado em filosofia), através de uma vida toda conformada à Verdade Divina, ou seja, através de uma vida vivida toda com amor. E coitado do filósofo de profissão, do intelectual que não vê a filosofia como algo para transformar sua vida. Este está correndo o grande risco de ser triste e frustrado, porque o conhecimento sem o amor apenas infla o ego, podendo estourar a qualquer momento.
Vivamos, pois, segundo a Verdade! Dessa forma, teremos a felicidade já aqui na Terra e depois no Céu! Deus abençoe a todos e que a Mãe da Sabedoria nos ajude a nos conformar cada dia mais ao Verbo divino que nela habitou antes de todo homem!
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